No início dos anos de 1990, eu pesava mais de 120 quilos. Mergulhado no trabalho e na cerveja e usando a comida para aliviar tensões, das mais variadas, pouco pensava na saúde. Aliás: nada pensava.
Como não tinha opções no mercado, comprava a calça que cobria a parte de baixo e camisas das mais largas, se possível pretas para disfarçar o indisfarçável.
Não era feliz, nem triste. Só pensava em viver cada dia, obtendo o máximo de prazer com o que podia ter com menor esforço, ou seja: comprando.
Mas, aos poucos, fui achando que poderia viver um pouco mais. Aumentei minha meta. Não pensava mais em somente romper os 40. Ultrapassar os cinquenta passou a me aprazer.
Entretanto, no meu corpo excediam 50 quilos. E não observava como deixá-los na estrada. Fazia tentativas, com resultados pífios.
Nos meados da década de 1990, um nadador master muito bonito, chamado Rômulo Arantes Júnior fazia sucesso nas novelas e programas da Rede Globo, ainda como coadjuvante.
Mas caminhava (ou nadava) facilmente para o estrelato.
Havia encerrado a carreira profissional (1987) repleta de glórias (como o ouro nos 100 costas na Universíada de 1977, o bronze no Mundial de Berlin, na mesma prova, no ano seguinte, e diversas medalhas em Pan-americanos e Sul americanos, além de inúmeros recordes continentais) e iniciava outra carreira, como técnico da “Romulo Arantes Nadadores”.
A associação, vale destacar, desenvolveu trabalhos em dezenas de academias do Rio, aglomerando mais de 9 mil nadadores.
Nos encontramos no Campeonato Brasileiro Juvenil, no Parque Aquático do Álvares.
Ele dirigia sua equipe com somente seis nadadores, todos medalhistas, e chamava a atenção pelo currículo invejável como atleta, por ser muito bonito e por ter atuado em mais de uma dezena de novelas, filmes e seriados, tais como “Brilhante”, “Paraíso”, “Vereda Tropical”, “A Gata Comeu”, “Sassaricando” e outras obras, para citar somente as da Rede Globo.
Rômulo orientava treino quando solicitei entrevista. Alto astral demais me pediu somente para aguardar dez minutos, pois ministrava a última série de atividades.
Foi tempo suficiente para o repórter fotográfico fazer belos registros do nadador master, técnico e ator promissor, que ilustraram no dia seguinte a primeira página do jornal.
O sol torrava os lombos, os meus viravam toucinho. Acabou o treino, Rômulo me chamou, apertou minha mão e sentamos debaixo de uma sombrinha dos Correios, empresa patrocinadora do evento.
Ele estava de sunga de praia e eu com aquelas roupas enormes já encharcadas de suor. Não demorou um minuto, ele me sugeriu tirar a camisa, observando o desconforto.
E fez isso mais duas vezes quando fiz a bobagem de aceitar a sugestão. Fiquei de barrigão de fora diante de um dos caras mais bonitos do Brasil e de atletas de corpos apolíneos que (ainda bem) me olhavam respeitosamente, preocupados mais com a disputa do evento previsto para a parte da tarde.
Tudo bem que fez parte da profissão para se obter bela reportagem, mas foi exótico demais a cena.
Durante a entrevista, observei como é a vida de ator com trabalhos na Rede Globo.
Toda hora chegavam jovens pedindo autógrafo ou fotos. Ele atendia generosamente.
As moças saíam com dois beijos nos rostos e os rapazes com um abraço de responsa.
Em determinado momento apareceu nadadora confirmando presença vip do Rômulo em danceteria da moda. Eu ouvi, cheio de inveja, o diálogo.
“Sua tia aceitou o cachê. Você falou para ela que é tudo por conta? Que vou levar duas pessoas? Você tem certeza que está tudo certo? Disse que vou atender a galera durante três horas. Que depois disso vou curtir um pouco?”.
A menina somente balançou a cabeça positivamente. E foi embora com olhos brilhando.
Encerrei a entrevista, já com a camisa encobrindo parcialmente a pança, agradeci e ele me abraçou de forma muito gentil. E disse que adorava estar ali, na beira da piscina. Era onde relaxava do mundo competitivo (bem mais competitivo) da televisão e do cinema.
Rômulo morreu de acidente de ultraleve próximo a sua fazenda, em Minas Gerais, aos 42 anos, no ano 2000, pouco tempo depois do nosso encontro.
Entrevistei grande parte dos medalhistas olímpicos do Brasil, da nova geração, e nenhum foi tão humilde e generoso. E olha que nem são atores globais. Tão pouco tão bonitos.
E jamais pediriam para eu mostrar o barrigão. Pelo contrário: alguns quase correram de mim por causa dele.